sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

O endeusamento de séries estrangeiras em detrimento das brasileiras

A internet trouxe para o público brasileiro inúmeras vantagens. Entre elas a interação instantânea entre as Redes Sociais e a programação de TV. Mas, sem sombra de dúvida, a popularização da internet no Brasil apresentou a maior das vantagens: a facilidade de acesso a produtos da TV internacional, com um olhar maior para os seriados.

A sociedade brasileira tornou-se rapidamente consumidora de seriados - em sua infinita maioria as produções oriundas dos EUA - e mesmo quem não é público fugaz da teledramaturgia nacional tornou-se rapidamente fã deste tipo de segmento. Com isso, é impossível não lançar um paralelo entre as produções estrangeiras e o que vai ao ar na TV aberta brasileira.

Não é difícil perceber que, como em qualquer área, a TV brasileira ainda não é tecnicamente avançada quanto em alguns países desenvolvidos. Muito do que se vê no Brasil - mesmo em linguagem e estilística - se viu lá fora há anos ou até décadas dependendo do contexto. A densidade de algumas produções e o alto investimento que permite um cuidado maior na área técnica aproximou dos seriados estrangeiros um público que não costuma ser fã de telenovelas e mesmo das séries brasileiras.

Com isso, o que se vê atualmente é uma espécie de disfunção em relação a comparação feita entre os produtos daqui e os de fora. Normalmente vê-se um desdém exagerado em relação a produções brasileiras, principalmente por parte de quem se torna fã de séries cultuadas por todo o mundo (como Downton Abbey, Homeland ou Breaking Bad), mas que não acompanha a evolução dos produtos brasileiros. É bem verdade que este também não é o público-alvo dos projetos exibidos pela TV brasileira, pois este é o público que irá sempre criticar, ainda que não tenha o menor interesse em assistir.

Mas se torna interessante notar como o endeusamento a produções americanas ocorre em detrimento de produtos nacionais. Ignorando as telenovelas que possuem uma linguagem própria e que, portanto, não cabe discutir o gosto pessoal de um ou de outro, e focando-se nos seriados, percebe-se que o Brasil vem avançando neste estilo, mas ainda assim, nota-se claramente um desdém por parte de uma parcela dos telespectadores. Esta, normalmente, é a parcela que não encontra adjetivos necessários para elogiar as produções estrangeiras.

O brasileiro, inclusive, parece ser mais fã de alguns produtos de lá que os próprios americanos. Série considerada cult, vencedora de inúmeras premiações, mas que nunca alcançou grande audiência, 30 Rock chegou ao fim na última semana e entre os 'série maníacos' (fãs de séries) houve um luto geral. De fato, a série construiu sua história baseada no bom humor, na qualidade de texto e atuações impecáveis. Não cabe discutir aqui a qualidade desses produtos.

Contudo, as mesmas pessoas que dispensam uma idolatria exagerada a esta série são as que torcem o nariz todas as quintas-feiras para a série brasileira Pé na Cova. Não há qualquer justificativa, apenas pelo fato de ser uma produção brasileira. Ao emprestar um olhar mais profundo para ela, percebe-se muita semelhança a série criada por Tina Fey. Humor ácido, repleto de referências pops e com muita crítica para todos os gostos, além do texto rápido com uma piada sobrepondo a anterior, além do elenco afiado.

Este fenômeno já havia sido notado quando a Rede Globo levou ao ar A Vida Alheia, outra produção de rara felicidade e que também apresentava um avanço na estilística de roteiro para este formato, mas que não fez o sucesso que poderia lhe garantir vida longa se encerrando ao final da excelente primeira temporada.

Infelizmente, o brasileiro parece não enxergar quando um produto nacional avança por um caminho interessante, raras as exceções - Louco por Elas é uma delas, que apresentou inovação para o Brasil, mostrando a metalinguagem no texto e fazendo relativo sucesso - e acaba não incentivando a produção nacional, preferindo criar vínculo com produções estrangeiras. Não que não se deva apreciar produtos de vários países, mas não há motivos para o desdém. É o que já acostumamos: a grama do vizinho parece sempre ser mais verde. Nem sempre é.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Fantástico dá aula de bom jornalismo

Qualquer estudante de jornalismo sabe a diferença básica entre informar e explorar. A TV brasileira tem se transformado especialista - de alguns anos para cá - em explorar tragédias. Em minha memória recente lembro que desde o caso Richthofen a mídia tem criado um jeito bastante peculiar de cobrir este tipo de evento que causa comoção no país. Os exageros na cobertura, o emocionalismo barato e a falta de bom senso são marcantes em praticamente todas as emissoras.

Em 2013 isso já aconteceu. O incêndio na boate Kiss, considerado um dos piores da História, foi um prato cheio para os carniceiros da TV. A cobertura midiática foi deprimente e o estilo grotesco de se fazer jornalismo marcou presença. O exemplo mais forte disso se deu durante a exibição de um jornalístico da Rede Record em que o apresentador Geraldo Luís teve a coragem de transformar seu estúdio numa espécie de metáfora da boate, com direito a fumaça e tudo. Ou seja, uma reprodução trash do ocorrido. Isso não é nem nunca foi jornalismo, isso é sensacionalismo na busca pela audiência. 

Obter audiência usando esses métodos, de fato, é fácil. Porém, a função primordial do bom jornalismo nunca foi audiência. Evidente que não adianta fazer bom jornalismo se não há quem escute, quem veja, mas o público é o fim e não o meio. Informar com qualidade, com respeito e sem ultrapassar a linha da exploração é o caminho que leva a uma audiência de nível, capaz de refletir e se posicionar. Este é o jornalismo, o que informa para formar.

Foi esta a aula que o Fantástico deu no último domingo. A premissa da principal reportagem da noite foi a mesma utilizada por Geraldo Luís e sua trupe: reconstituir o que aconteceu na Boate Kiss. O diferencial, contudo, foi o tratamento dispensado. Sem gritos, sem maneirismos e sem sensacionalismo, o jornalístico tratou o tema de forma séria, responsável e mostrando os problemas estruturais do prédio, além de ouvir especialistas e testemunhas. Em suma: uma aula de bom jornalismo.

Este tipo de tragédia suscita o que há de pior no ser humano. A sede por aparecer, por mostrar-se detentor da verdade está inerente aos humanos. O jornalista é, talvez, quem mais tenha voz junto à sociedade e, portanto, essa necessidade acaba se fazendo presente nesses momentos. Mas vai do editorial da empresa seguir uma linha de respeito e privilegiar a informação em detrimento do posicionamento pessoal. Infelizmente, neste caso, a Record não fez isso e essa postura equivocada de seu jornalismo já está tornando uma espécie de marca ali.

Os editores e diretores de jornalismo da emissora deveriam ter assistido o Fantástico na noite de ontem. Talvez assim, aprenderiam como fazer uma reportagem interessante, chamativa e com qualidade, sem precisar descer o nível.

Twitter Facebook Adicionar aos Favoritos Mais

 
Tecnologia do Blogger | por João Pedro Ferreira