segunda-feira, 29 de julho de 2013

Novos Rumos, novos tempos e um até breve

Em Abril de 2009 comecei este projeto. São 04 anos de muitos textos - alguns mais polêmicos que outros - e de muito crescimento. Quando comecei, tudo não passava de um hobby. Queria poder escrever sobre tudo que aprendi assistindo e estudando sobre TV e teledramaturgia e percebi que o melhor caminho era um blog - afinal, a internet é o grande booom do milênio, ne? - mas nem nos meus melhores sonhos imaginei a proporção que isso teria.

Em 04 anos, tive o prazer de debater temas importantes e acompanhar, com um olhar que foi ficando cada vez mais crítico e afiado - obras importantes de nossa teledramaturgia (Avenida Brasil, olá!) e mudanças importantes na grade da TV aberta (o troca-troca de Eliana e Gugu e a saída do próprio Gugu do ar depois de anos). Nem sempre os leitores concordaram com minha visão crítica e fui acusado de tudo (fãs da Record diziam que eu era apaixonado pela Globo, fãs da Globo diziam que eu perseguia a emissora, e assim por diante), mas ainda bem que todos liam os textos.

Neste tempo tive o prazer de criar o Troféu TVxTV que acabou pro repercutir muito mais que o esperado, tendo grande participação dos internautas e também reunindo uma galera interessante e que entende de TV - embora não trabalhe totalmente no ramo - para votações. Momentos interessantes e que deram grande alegria a este blogueiro.

Também é inegável o quanto cresci na internet graças a este espaço. Conheci pessoas novas, abri novos caminhos e tive oportunidades de coberturas de eventos das próprios emissoras. Escrevi - por conta deste blog - a outros veículos que também contribuíram muito para minha formação de crítico e me ajudaram a produzir e veicular meus textos de forma cada vez mais impessoal e mais profissional. O olhar crítico foi ficando mais apurado na medida em que novos textos eram produzidos e assistir TV tornou-se quase um trabalho, além de um grande prazer.

Mas tudo nesta vida muda. Nunca tive a intenção de ser crítico de TV ou de teledramaturgia - embora seja assim que muita gente chega a mim e me conhece - e não é esta marca que quero para minha vida. Graças a este blog e também a estas críticas tive a oportunidade de conhecer novas pessoas e de me preparar melhor para aquilo que acredito ser a minha praia. 

Desde o início de 2013 venho levando o TVxTV como dá, tentando a todo custo produzir textos e atualizá-lo, mas tornou-se completamente inviável. O tempo de minha vida é outro, preciso utilizar este momento para me dedicar em aprender e profissionalizar naquilo que realmente quero e, por isso, é tempo de despedida. Depois de 04 anos, encerro este blog para me dedicar a outros projetos - que espero que logo se realizem e tornem-se públicos - mas o carinho pelos textos, pelas polêmicas e, principalmente, pelos amigos conquistados, jamais irá embora.

Agradeço a todos que diariamente marcaram presença aqui e também aos que, além de ler, dedicaram seu tempo para comentar. Tenham certeza que li cada comentário e fiquei bastante satisfeito, mesmo quando pontos de vistas divergiam. Este não é um adeus, pois vamos nos reencontrar em breve, em outros lugares. É só um, até breve.

PS: Aos que quiserem me acompanhar, haverá sempre opiniões sobre o que acontece na TV em meu twitter e em meu perfil no facebook

terça-feira, 16 de julho de 2013

Amor à Vida é um retrocesso para a teledramaturgia nacional

O Brasil vem avançando em diversos segmentos quando o assunto é teledramaturgia. Obras importantes entraram no ar nos últimos anos e se tornaram fundamentais para dar um guinada ao modelo de produção dramática para a TV brasileiro. Tanto na TV aberta quanto na TV fechada, o avanço é nítido e salutar para o fortalecimento da marca. Infelizmente a atual novela das 21 Horas, Amor à Vida, representa um retrocesso para as telenovelas brasileiras.

Fosse exibida no final dos anos 80, talvez seria uma trama envolvente e bem avaliada, mas ela está, pelo menos 25 anos atrasada. O modelo adotado por seu autor, Walcyr Carrasco, reúne todos os recursos e saídas adotadas por outros folhetins e que foram sendo abandonados ao longo do tempo. Há quem possa considerar isso um sinal positivo, de retomada de um formato abandonado, ocorre que este formato foi deixado de lado justamente por outros foram surgindo, inovando e deixando muitos desses recursos - senão todos - com cheiro de mofo e pouco cultural.

Quando uma criança pede uma leitura para seu pai, evidente que se ele ler Machado de Assis a criança não compreenderá praticamente nada, pois o texto é muito complexo para quem ainda está construindo valores culturais. Por isso, o público brasileiro foi mastigando textos menos complexos ao longo da história das telenovelas e elas foram fundamentais para fortalecer o estilo no país. Mas atualmente, estamos diante de um público mais maduro - ou que deveria ser - já acostumado a trabalhos menos óbvios e com linhas sensíveis e fugindo do caminho fácil.

O Brasil avançou muito nos folhetins nos últimos tempos. Mesmo no horário das 21 Horas, o público já acompanhou histórias de clonagem (O Clone), tramas policiais intrincadas e complexas (Belíssima), além de textos rebuscados e com diversas camadas (Avenida Brasil). Sentar-se diante da TV para acompanhar texto com saídas óbvias e recursos utilizados nos primórdios da telenovela torna-se um tédio e é prejudicial para o público e para a marca.

O tom de dramalhão incontido, os diálogos infantiloides - que acompanham o autor por praticamente todos os seus trabalhos - e a constante sensação de estarmos numa eterna barriga tornam Amor à Vida uma novela sem charme e que não acrescenta nada. Nem para quem assiste, nem para quem produz, tornando-se um equívoco e um retrocesso.

Se há algum ponto positivo na trama, trata-se de sua direção caprichada. Mauro Mendonça Filho bebeu da fonte de trabalhos mais recentes, tanto em takes, como na fotografia, e mostrou-se antenado quanto aos avanços que o país conquistou. O elenco também, firme e muito bem em cena, é um ponto alto, mesmo diante de um texto rocambolesco e que não produz nenhum tipo de sensação.

Amor à Vida tem uma boa história, mas infelizmente contada a moda antiga e que não consegue ser nostálgica. A saída para um texto que bebe da fonte dos anos 80 e parece parada no tempo seria justamente a nostalgia, mas nem isso ela consegue. Um retrocesso. Apenas isso.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Estreia de Chiquititas aponta para grande avanço do SBT

Após arriscar-se com o remake de Carrossel - que o tempo mostrou ser um acerto - o SBT estreou na noite desta segunda-feira, 15, um projeto ainda mais audacioso: o remake de Chiquititas. Produzir um remake de uma obra que tornou-se cult no imaginário da atual geração de adultos e contribuiu para a formação de praticamente toda uma geração de crianças e adolescentes era um risco sem precedentes. Em termos de fenômeno de mídia era impossível comparar Carrossel com Chiquititas, a segunda fez parte da vida de todo um grupo de pessoas.

O risco era grande, pois além de tudo, trata-se de uma novela mais adolescente e, portanto, poderia perder o público que a emissora ganhou com a exibição de Carrossel por mais de um ano. Os nostálgicos poderiam comparar e não gostar da nova versão e, o pior, os novos adolescentes poderiam odiar todo o clima de inocência e pureza da história. Um mar de riscos. Mas, ao menos na estreia, tudo deu certo.

O grande acerto de Íris Abravanel - responsável pelo roteiro nesta adaptação foi entender que não era necessário arriscar. Pequenos retoques no texto original, trazendo-os para os dias de hoje, foram suficientes. Todas as personagens que marcaram a adolescência dos anos 90 estavam la: Mili, Mosca, Pata, Bia e tantos outros. O texto não se arriscou e mostrou-se burocrático, um grande acerto para um trabalho assim tão ousado.

O elenco também mostrou outro acerto desta estreia. As crianças que, em praticamente todas as aparições de divulgação na grade do SBT, pareciam não ter carisma, ledo engano. Todas elas encorporaram suas personagens e conseguiram o mais importante: transmitir a doçura que o projeto Chiquititas exige. O elenco adulto também fez bonito e merece destaque, parece que vai dar liga.

O ponto alto da noite, contudo, não foi nada disso. O maior mérito é da direção. A compreensão de que trata-se de um projeto juvenil e não infantil foi fundamental para essa estreia ser considerada um acerto, mas a direção foi além e soube construir elementos para manter o público infantil. Pequenas doses de infantilidade num ambiente juvenil foi o tempero correto que a produção precisava para o sucesso. É preciso parabenizar ainda a produção pela competência e avanço. O novo projeto avançou muito no quesito fotografia e direção se comparada a Carrossel. Além de tudo, a abertura é linda e o clipe exibido foi de uma qualidade que impressionou.

Impossível apostar em sucesso ou fracasso, mas a tirar pela estreia, Chiquititas já é um sucesso. Conseguiu, no mínimo, deixar adultos completamente nostálgicos e com olhos brilhantes diante da TV enquanto relembravam momentos únicos. Mais do que isso, essa estreia serve para mostrar que o SBT avança na produção de teledramaturgia.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Qual o público de Malhação?

Entra ano e sai ano e muitas são as novidades que a TV aberta oferece para os telespectadores. Apostas de diversos tipos que as emissoras tentam para melhorar sua audiência, sejam em novelas, programas ou séries. Na grade de programação, o que parece imutável - no que concerne a teledramaturgia - é Malhação. A novelinha teen da Rede Globo enfrentou todo tipo de crise, mas segue inabalável já entrando em sua 21ª temporada - um recorde absoluto.

Quando a trama entrou no ar, a proposta divulgada era clara: uma novela que apostasse no público teen - adolescentes e jovens - com temporadas de aproximadamente um ano e modificando todo seu elenco a partir da temporada seguinte. Por muitos anos, o produto viveu tempos áureos, levando ao ar temporadas incríveis e conseguindo produzir identificação no adolescente brasileiro, mesmo enfrentando dificuldades, como a Classificação Indicativa e o pragmatismo do telespectador.

Foram discussões importantes para o universo teen, como doenças sexualmente transmissíveis, bullying, a difícil relação entre pais e filhos, os dramas e medos do ano de Vestibular, adolescentes que precisam ser adultos e muitos outros temas de suma importância. Mesmo com todas as dificuldades que a TV aberta enfrenta para tratar temas delicados, a novelinha sempre encontrou saídas interessantes que chamavam a atenção do telespectador e davam ótimos resultados.

É evidente que em 20 temporadas completas, torna-se impossível acertar em todas e equívocos acontecem em praticamente todos os projetos longos. O problema se dá quando determinado produto se mostra desgastado e não há como enxergar uma saída viável. Este parece ser o caso de Malhação que sofre de um desgaste que impressiona.

Não se discute se vale a pena ou não manter o produto no ar, pois ele é muito importante para a emissora, pois investe em novos rostos, novos diretores e profissionais da área. Funciona como uma ótima oficina prática e isso não pode ser deixado de lado. Diversos talentos nasceram ali e isso deve ser levado em consideração numa análise mais ampla.

Ainda assim, é preciso parar e fazer uma reflexão sobre o andamento do roteiro dessa novela. Não apenas a temporada atual - que está apenas iniciando, portanto a avaliação ainda é prematura - mas as anteriores também parecem ter perdido o foco. Faz algum tempo que Malhação não consegue cumprir seu objetivo de atingir o público teen simplesmente porque seu roteiro parece não ser desenvolvido para esta faia etária. Ainda que os temas continuem sendo deste universo, as situações e, principalmente, os diálogos estão longe da realidade teen, muito longe.

Todo o trabalho de pesquisa parece ser ignorado nos últimos anos e, mesmo quando a proposta da temporada é interessante e o texto bacana, o que se vê no vídeo é um produto que não cumpre seu objetivo de chamar a atenção de adolescentes e jovens. Quem tem essa idade certamente não se sente espelhado quando assiste ao show e, provavelmente, este seja o principal motivo da queda brusca de audiência temporada após temporada.

Séries teen já conseguiram ler a alma desta faixa de público nos últimos anos. É o caso da sensacional Skins, série britânica que faz uma leitura impressionante de adolescentes, que deveria servir de espelho para qualquer produção mundial quando o assunto é jovem. É evidente que num país como o Brasil não se pode exibir algo tão ousado, mas Malhação já conseguiu fazer leituras - ainda que superficiais - dos adolescentes brasileiros, mas perdeu a mão faz tempo. É preciso encontrar o caminho ou pensar em outra proposta.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Brasil ainda engatinha quando o assunto é séries

É fato que o Brasil é um dos países - senão o maior - que melhor produz telenovelas em todo o mundo. Nossos folhetins são comprados por centenas de países e milhões de pessoas admiram o trabalho de composição deste formato com linguagem própria, indo ao ar diariamente e com toda uma estilística definida. Em compensação, enquanto o mundo avança em produções de qualidade quando o assunto é séries, o Brasil parece não conseguir deixar de engatinhar.

Os motivos são os mais variados, vai da falta de investimento até a pouca experiência. Para alguns especialistas, este cenário deve mudar nos próximos anos graças a Lei de Cota de Produção Nacional da TV fechada. A Lei obriga todos os canais de TV a cabo a levar ao ar um número de horas específicas de produção nacional e isso tem feito o mercado se movimentar, já levando ao ar alguns produtos, mesmo em 2013 quando a Lei está em momento de adequação.

É evidente que, quanto mais se produz, maiores são as chances de conseguirmos assistir séries de qualidade. Como o país ainda engatinha neste formato, é bastante lógico entender que não há como se exigir produtos muito rebuscados, mas é preciso ter senso crítico para tentar enxergar o que pode ou não ir ao ar, no momento em que se avalia determinado roteiro. A justificativa de que, como é o início, toda tentativa é válida soa muito pobre, pois é possível apostar em roteiros com um mínimo de qualidade.

Arriscar-se no drama talvez seja o mote ideal para o momento. O Brasil passou décadas investindo exclusivamente no humor - tanto na TV aberta quanto no Cinema - e conseguiu avançar. Haja visto que os últimos anos apresentaram produções interessantes neste formato, como as excelentes Louco por Elas e Pé na Cova. Essas duas são representações de que o país consegue ir além do humor fácil e simplório que fomos acostumados por muitos anos.

Mas a TV a Cabo ainda derrapa. Tanto no drama quanto na comédia, percebe-se uma clara boa vontade e intenção de acertar, mas os erros tornam-se cada vez mais evidentes conforme a grade de programação começa a ceder espaço para séries nacionais. Diante de um ou outro acerto, o que se vê é uma sucessão de erros que não demonstram apenas falta de experiência, mas o equívoco de imaginar que um produto pode sobreviver apenas com o nome de alguém envolvido.

No drama, as emissoras fechadas vem fazendo algumas tentativas válidas de se produzir algo realente interessante. É o caso de Três Terezas e Sessão de Terapia, ambas da GNT - emissora que mais tem investido até este momento - que conseguem sair do óbvio e, embora ainda cometam deslizes, demonstram estar no caminho certo. Em compensação, também há equívocos, como o caso da fraquíssima Copa Hotel que não disse a que veio ou de Contos de Edgar, uma tentativa insana com roteiro pífio.

A estreia desta segunda-feira, 08, Vai que Cola, do canal Multishow, segue este caminho, mas na comédia. Um produto que certamente exigiu algum investimento financeiro importante por parte da emissora, mas que parece não ter passado por qualquer avaliação prévia de seu roteiro antes de ir para o ar. A impressão que se teve é que todos confiaram no talento de Paulo Gustavo e não fizeram uma avaliação mais apurada do que estavam produzindo e o resultado foi catastrófico.

É impensável que, enquanto a TV aberta já consegue levar ao ar produções de humor do nível de Pé na Cova, a TV Fechada apresente uma série que regrida tanto em qualidade. Com piadas de sentido sexual, e sempre buscando a saída fácil, o roteiro foi extremamente pobre e não explorou os caminhos que a comédia deve explorar. Não houve qualquer sutileza, seja nos diálogos superficiais e caricatos, ou na interpretação de um elenco que, sobretudo, não percebeu que teatro é teatro e TV é TV. Com muita gritaria, o resultado não tinha como agradar. Embora com momentos - raros - de lucidez, a série não parece ser a luz que a teledramaturgia busca na comédia. Está longe disso.

Estamos diante de um momento fundamental para nossa teledramaturgia, pois muitas séries começarão a ser produzidas nos próximos anos. É preciso um olhar mais atento para que consigamos levar ao ar algo de real qualidade e manter a excelência que nos acostumamos com as novelas. Pelos primeiros resultados, não parece uma tarefa fácil

domingo, 7 de julho de 2013

Uma boa sinopse não é sinal de um bom produto

O primeiro passo para se saber se estamos ou não diante de um bom produto é sua sinopse. É bem verdade que o grande público não tem acesso a uma sinopse completa - seja de novela ou de série - mas ainda assim é possível arriscar-se baseado nas informações que são divulgadas sobre determinada história antes de sua estreia. Este pode ser um caminho perigoso, uma vez que nem sempre a sinopse seja um indicativo verdadeiro sobre o que entrará no ar. Ainda assim, quase sempre é simples saber se estamos ou não diante de uma boa história.

Criar uma boa história é muito difícil. Mais difícil ainda é saber desenvolvê-la com a mesma sagacidade. Quando um autor imagina toda a construção de determinada história em sua mente e resume-a em seu computador, costurando assim a sinopse, pode-se estar diante de uma ideia brilhante. Daí a conseguir desenvolver com a mesma competência, há uma enorme diferença. É surpreendente assistir uma simples história sendo contada de forma competente, mas é frustrante acompanhaá-la enquanto se perde dia após dia.

Existe uma diferença grande entre pensar na história como um todo e colocá-la em prática diariamente - ou semanalmente, no caso de séries - os obstáculos começam a aparecer somente na construção do roteiro diário e é nele que os obstáculos vão aparecendo e, com eles, os atalhos extremamente perigosos que quase sempre culminam no enrosco de um bom projeto. Nem todo autor tem a mesma competência para desenhar um roteiro diário quanto tem para criar as linhas gerais e, quando ele não se atenta a isso, cercando-se de uma equipe competente, os resultados normalmente são desastrosos.

Não basta para um bom produto apresentar histórias e situações ousadas. É preciso contá-las de forma pertinente e crível, fugindo de atalhos quase sempre prejudiciais. Insensato Coração mostrou-se uma novela problemática justamente por equívocos de desenvolvimento. Sua história - muito interessante - foi contada com freio de mão puxado dando um tom de um prólogo eterno para sua primeira metade. 100 capítulos que poderiam ser contados em 40, no máximo e isso acabou por atrapalhar o desenvolvimento saudável da vingança de Norma (Glória Pires).

Balancear o desenvolvimento de uma história não é fácil. Na atualidade quem mostra-se mais competente nisso é João Emanuel Carneiro que consegue fugir das famosas barrigas - período em que não acontece nada nas novelas - criando diversos momentos importantes em suas tramas. Desenvolver uma boa história no timing correto quase sempre resulta em sucesso, vide Avenida Brasil.

A atual novela das 21 Horas, Amor À Vida, é um prato cheio para esta análise. Estreante no horário, Walcyr Carrasco não se fez de rogado e levou para a TV diversos temas polêmicos e pertinentes. Autismo, doença terminal e um vilão gay são três dos muitos temas tratados na novela. Ao se pensar exclusivamente nos temas e no desenho geral da novela parecia claro: estávamos diante de uma grande obra televisiva.

Não é o que acontece na prática. Embora tenha ousado em criar todas essas histórias, o autor se perde ao tentar desenvolvê-las, principalmente porque oferece ao telespectador um texto raso, com situações que não são aproveitadas ao máximo e diálogos didáticos que atrapalham o ritmo da história. Com isso, um folhetim que poderia ser dos mais interessantes, torna-se apenas chato e um desperdício.

Achar o ponto correto para transformar uma boa sinopse em um bom produto não é tarefa fácil. Principalmente se pensarmos que uma novela fica no ar cerca de 07 meses, é uma tarefa hercúlea conduzir esta história diariamente. Mas se o autor se propôs a fazer isso, cabe a ele encontrar instrumentos para conseguir, ou então, o resultado não agrada.

sábado, 6 de julho de 2013

Realismo Fantástico precisa seguir lógica em sua mitologia

O Brasil sempre apostou em Realismo Fantástico para fazer sucesso em suas obras de teledramaturgia. O público brasileiro comprou a ideia e transformou em fenômenos de audiências novelas que apresentavam personagens desse estilo. De obras trashes, como Vamp, até mais sutis, como Sexo dos Anjos, o fato é que a história da teledramaturgia nacional é repleta de exemplos bem sucedidos de formatos assim e que arrebataram o grande público.

É bem verdade que nos últimos anos este formato foi deixado de lado na telenovelas nacionais. Sob o argumento que o telespectador procura tramas mais realistas, pois quer se ver espelhado no que assiste, a estilística foi mudando e o lugar-comum ganhou um espaço maior.  A última lembrança de realismo fantástico na TV brasileira talvez seja na bem-sucedida, porém abortada, série A Cura de João Emanuel Carneiro e a novela O Astro, remake adaptado por Alcides Nogueira, que culiminou com um Emmy Internacional.

Um ponto fundamental para se produzir uma história com realismo fantástico é sua mitologia. Ao contrário do que se pode pensar, criar personagens com poderes ou com características além das do ser humano, não significa necessariamente que este personagem pode fazer tudo. É preciso construir uma história lógica, ou seja, a mitologia, para que quem assiste saiba exatamente o que o personagem pode ou não pode fazer. O maior exemplo contemporâneo disso seja, talvez, a série americana Supernatural que sabe explorar muito bem os elementos sobrenaturais, mas construiu uma mitologia sólida e que o público volta e meia é convidado a lembrar-se, com sequências desde a primeira temporada. Os personagens não fazem atualmente o que, no início, não podiam fazer, é a figura mitológica que dá verossimilhança para quem vê.

Quando o produto não consegue transmitir essa verossimilhança e sua mitologia é um samba-do-crioulo-doido, tudo se desfaz. O que foi criado para atrair acaba irritando, porque o fantástico deixa de o ser e se torna frustrante e com dezenas de erros apontados. Outra série americana serve de exemplo para esta máxima, trata-se de Heroes, um produto que começou com força e cheia de elementos que chamaram a atenção e se perdeu porque não soube construir uma mitologia lógica e, mesmo quando construiu, a destruiu para tentar contar a história.

Se a justificativa do autor é a de que "é realismo fantástico" para que seu personagem possa fazer tudo, já podemos saber que se trata de uma saída preguiçosa. Esse formato só funciona se for muito bem trabalhado para que o telespectador possa comprar os absurdos - para o plano da realidade - como algo verdadeiro dentro daquele contexto, daí a importância de regras básicas muito bem delineadas.

Em Saramandaia este problema acontece. Numa sequência interessante exibida na última sexta-feira, vimos o personagem de João Gibão (Sérgio Guizé) - que prevê o futuro - tendo uma visão de que Vitória Vilar (Lília Cabral) levaria um tiro. A partir daí ele e Zélia Vilar (Leandra Leal) saem numa busca desenfreada por Vitória a fim de evitar que a visão se consuma. Perfeita a sequência que serviu para construir planos de ação para o capítulo e chamar a atenção do público.

Porém, o dom de Gibão não obedece a nenhuma regra. A mitologia é furada e funciona a bel prazer do autor, mostrando-se equivocada. No primeiro capítulo vimos que o personagem teve uma visão da cidade de Bole-Bole mudando seu nome para Saramandaia e até agora isso não aconteceu. Num capítulo desta semana, novamente ele teve uma visão, desta vez com Dona Rdonda (Vera Holtz) explodindo - a visão já havia acontecido em outra ocasião. Esta visão especificamente também poderia ser atribuída a bomba que explodiu no final do capítulo desta sexta-feira. Não importa. O fato é que, em determinado momento, a visão de Gibão indica algo que vai acontecer em instantes e em determinados momentos algo que vai acontecer sabe-se lá quando. Como o personagem sabe distinguir o que vai acontecer no momento e o que não vai?

Construir uma história de realismo fantástico sem se apoiar numa mitologia quase conservadora para evitar furos é o melhor caminho. De nada adianta impressionar o público com personagens fascinantes e mágicos se a história segue exclusivamente uma única regra: a da saída fácil e preguiçosa.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Telespectador Brasileiro é atrasado

Produção de TV vai muito além que enxergar pequenos pontos manchados e torná-los análises fundamentais para se entender o comportamento do público. Televisão não pode - e nem deve - ser entretenimento passivo. Não se pode esperar que um meio de comunicação de massas se renda exclusivamente ao gosto do público. Em primeira análise, essa afirmação pode soar absurda, mas está longe de ser equivocada. 

O Brasil é um país atrasado em diversos segmentos - talvez por isso estamos diante de um momento histórico de protestos - mas, levando toda essa onda para a teledramaturgia, pode-se afirmar sem medo de exagero que o telespectador brasileiro é atrasado. A máxima é simples e verdadeira, ora, se o país é atrasado em praticamente tudo, evidente que seu povo é atrasado também, inclusive quando falamos de busca correta por entretenimento. A analogia perfeita neste caso se dá com uma criança que quer tudo, mas cabe aos responsáveis saber o que pode e o que não pode e ensinar esta criança. É isso que a produção de TV deveria fazer com o público: ensinar.

As grandes referências de sucesso atual na TV mundial são tipos complexos e que fogem do arquétipo do bom moço ou do pior vilão. Em Breaking Bad - série americana sucesso de crítica - o protagonista fabrica drogas. Homeland, outro sucesso da TV americana, a mocinha sofre de bipolaridade e se envolve com quem, supostamente, teria de investigar. Países desenvolvidos compreenderam, também na teledramaturgia, que ninguém é puramente bom ou mau e conseguem humanizar personagens complexos a ponto de construírem tipos inesquecíveis.

No Brasil essa tarefa parece muito mais árdua. O público brasileiro parece somente conseguir torcer para dois tipos de personagens. A mocinha que é a personificação da bondade e pureza ou para os vilões tórridos, mas com veia cômica. Muitas novelas já sofreram hecatombes de críticas ao se verificar uma tentativa de mudar este cenário. América teve sua protagonista rejeitada porque ela escolheu seu sonho de morar nos EUA a viver a história de amor proposta. Mesmo em sucessos, como Avenida Brasil, o público se incomoda. Houve - muita gente - quem criticasse o fato de Nina optar pela vingança e deixar em segundo plano seu amor por Jorginho.

A prova do atraso do público brasileiro se dá em Sangue Bom. A construção semiótica da protagonista Amora vem se mostrando complexa e rica em detalhes. Uma pessoa cheia de conflitos e que caminha o tempo todo na tênue linha entre a vilania e a bondade. A personagem é uma construção quase semântica do ser humano. Amora não é boa ou má, ela é influenciada pelo meio em que vive, como qualquer um de nós. As linhas fortes do texto competente de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari apresentaram uma personagem tão rica que permite a Sophie Charllote sua melhor interpretação na TV. A atriz soube construir a personagem com a fúria necessária para quem vive em meio a lobos, mas também que sabe viver intensamente aquilo que acredita. Ponto para a atriz.

Ainda assim, o público não consegue torcer pela mocinha. Segundo resultado da pesquisa que a emissora faz junto ao público - divulgada pela jornalista Patrícia Kogut - o telespectador torce por Bento, mas não consegue torcer por Amora, embora queira. Isso significa que o público não compreendeu a proposta da personagem e, consequentemente, não compreendeu a proposta da trama.

Entendo que seja muito mais fácil conquistar o telespectador criando caricaturas de representação do bem, como é o caso da mocinha de Amor à Vida, Paloma (Paolla Oliveira). Mas produtos que fogem do óbvio e buscam sutileza e profundidade produzem um resultado muito melhor, no que concerne à reflexão.

É preciso encontrar meios para que o público compreenda que a ambiguidade de Amora não é um comportamento tortuoso ou uma falha, mas é uma construção de personalidade e é justamente isso que dá todo o charme, mas não se pode abrir mão da proposta apenas para agradar. Sangue Bom é a melhor novela no ar - e uma das melhores do horário - e é preciso cuidado para não abrir mão de toda sua estrutura muito bem construída simplesmente para tentar melhorar índices de audiência.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Saramandaia acerta ao inserir debate político

Estreia da última segunda-feira, 24, a nova novela das 23 Horas, Saramandaia - obra original de Dias Gomes e com assinatura de Ricardo Linhares neste remake - iniciou num momento tão cirúrgico para o país que, em determinados momentos, a semelhança entre ficção e realidade causaram certa estranheza em parte da audiência.

Como se sabe, o principal objetivo de uma novela é entreter, mas já debatemos inúmeras vezes a possibilidade de se criar elementos culturais e artísticos pelos olhos da teledramaturgia e, quando se consegue este objetivo, a obra em si consegue atingir um patamar elevado, pois conseguiu contribuir na formação de seu público. Embora este debate seja recorrente, ele continua de fundamental importância e, aparentemente, autores e produtores têm se preocupado cada vez mais em levar produtos de qualidade e com algum objetivo cultural.

Especificamente nesta estreia, acompanhar borbulhar político que vive o município de Bole-Bole - em que dois grupos de moradores debatem a mudança ou não do nome da cidade para Saramandaia - causou uma proximidade tão grande entre público e obra que, em determinados momentos, a novela parecia encomendada pela emissora por conta do clima de protestos que o Brasil atravessa.

Mesmo com as coincidências por trás  disso - e são apenas coincidências, a novela estava encomendada há tempos - é preciso curvar-se diante do brilho de Dias Gomes. Uma obra escrita há décadas torna-se tão atual graças ao descalabros políticos que o país vive desde aquele período até hoje. Mas é preciso também mencionar a sensibilidade do autor deste remake, Ricardo Linhares, que soube transportar toda a estilística do autor original para os problemas atuais de nosso país.

Neste primeiro capítulo já se percebeu que Saramandaia chegou para colocar o dedo na ferida. Travestida de comédia, a trama não é um simples drama, mas é um mar de críticas por todos os lados e a todos os grupos - inclusive ao próprio povo. É importante enxergar as muitas camadas de críticas que a novela faz, as mais óbvias e as mais densas - estas, através dos estranhos personagens que enxergaremos melhor ao longo da exibição e que todos possuem um caráter simbólico importante.

O momento vulcânico que o Brasil atravessa mostra-se bastante favorável a uma trama assim, que permite-se criticar a política e a sociedade brasileira sem medo de cutucar a ferida de forma profunda. Ao menos nesta estreia, Saramandaia lembrou bastante outra obra icônica - Anos Rebeldes - que tinha forte cunho político e acabou coincidindo com outro momento importante para a democracia brasileira, os cara-pintadas. 

Num momento de aparentes mudanças fundamentais para a sociedade brasileira, a TV cumpre seu papel no jornalismo, na cobertura de massa, mas aparentemente, também conseguirá marcar presença na teledramaturgia, através do timing perfeito que a Rede Globo teve  - por pura sorte, diga-se - em levar ao ar a melhor novela para este momento. E esperamos que as discussões em Bole-Bole possam levar o povo brasileiro a reflexões sobre nossas próprias discussões.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Produção independente pode salvar a TV aberta nacional

Muito se especulou - e depois se confirmou - que a Rede Record passará, paulatinamente, a terceirizar boa parte de sua programação. É possível que programas de variedades, séries, minisséries e - talvez - até novelas sejam produzidos via produção independente. Nesta semana a especulação ganhou outra emissora: o SBT. Ainda é cedo para afirmar se a rede de Sílvio Santos também pensa em seguir este modelo, o que pode-se dizer é que este novo formato pode ser a tábua de salvação da TV aberta e representar uma ruptura importante.

Num país em que mais de 60% da publicidade com TV fica na líder de audiência - e com méritos, é preciso salientar - a concorrência precisa ser criativa se quiser apresentar para o público programas inteligentes, instigantes, que consigam atrair audiência e alcançar bons resultados comerciais - pois é exatamente disso que as Redes de televisão sobrevivem e não é possível esquecer que sem dinheiro não se produz muita coisa de qualidade.

A nova Lei da TV paga contribuiu sobremaneira para movimentar o mercado e criar novos profissionais nas mais diversas áreas. Mas mais do que isso, serviu para dar prática a uma vertente de profissionais que não a tinham: as produtoras. Pouco ou quase nada se via de produção independente na TV brasileira e, por isso, os profissionais ficavam amarrados a uma só emissora, engessados em sua criatividade e passando anos fora do ar. Agora, ao menos na TV paga, o movimento caminha para o modelo que os EUA adota com qualidade há muitas décadas. É evidente que o Brasil tem sua própria realidade e precisa adequar-se a ela, mas o modelo é bastante semelhante.

Agora, a TV aberta tem a chance de também dar este salto. Enquanto o mercado publicitário mantém seus olhos exclusivamente na Rede Globo por conta de tudo que ela representa, a concorrência tem a chance de ver seus custos reduzidos através da terceirização. Parece que, num cálculo simplório, quem vai quebrar são as produtoras, mas isso está longe de ser verdade. A lei de incentivo cultural da ANCINE não permite que produções de emissoras de TV sejam beneficiadas com investimentos financeiros, mas garante isso a produtoras independentes.

A matemática é simples: as emissoras de TV dizimam seus custos e pagam apenas pela aquisição dos programa já prontos. As produtoras terão um custo muito menor que as emissoras de TV, pois serão beneficiadas com a lei de incentivo da ANCINE. Com custos reduzidos, pode-se investir em novas áreas, em maior gama de produtos e ter resultados de audiência melhores, atraindo a atenção do mercado publicitário.

Embora as experiências de produções independentes ainda sejam traumáticas, o maior exemplo disso é o fiasco chamado Metamorphoses, levado ao ar na Rede Record, mas produzida de forma independente pela Casablanca e que teve uma audiência pífia, mas é preciso investir até que todos entendam o novo momento e as necessidades do telespectador.

Difícil prever o que pode acontecer, mas é possível acreditar que, feito um trabalho profissional e se as emissoras de TV aberta perceberem que estão diante de um importante momento e que pode significar uma ruptura fundamental para sua sobrevivência, um novo desenho poderá ser feito da televisão aberta no Brasil nos próximos 20 anos. É esperar para ver.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

A censura, as classes representativas e a dramaturgia no Brasil

O Brasil é um país que lutou muito para que seu povo conquistasse uma série de direitos que, hoje em dia parecem simples. Atualmente é possível encontrar classes representativas de praticamente todos os grupos - de profissionais ou não - tudo isso graças a uma série de conquistas que a sociedade como um todo fez ao longo de nossa história. O problema é quando determinadas classes extrapolam o direito de defender seus associados e acabam tentando praticar a censura, normalmente contra a dramaturgia.

A TV brasileira se tornou quadrada justamente por este tipo de interferência externa que prejudica a criatividade dos autores e atrapalha a liberdade de criação dos produtores. E isso vem acontecendo neste milênio, pois não era algo visto nos anos 90. Significa que, em meio a um mundo tão globalizado e tecnológico, o Brasil regride quando é esse o assunto tratado.

Durante a exibição de Passione houve um protesto formal dos pilotos da Stock Car - principal categoria automobilística do Brasil, que é patrocinada pela Rede Globo, a mesma que produziu a novela - porque um dos personagens do folhetim de Sílvio de Abreu, o piloto Gérson (Marcelo Anthony) tinha um grande e tenebroso segredo. Os pilotos não queriam "manchar" a marca e pediram a emissora que intervisse na linha criativa do produto.

A novela Mulheres Apaixonadas também sofreu reclamações por conta da personagem  Santana (Vera Holtz), uma professora que enfrentava problemas com o álcool e, por vezes, chegou a ir trabalhar bêbada. Os professores fizeram forte pressão porque enxergaram que estavam sendo difamados pela obra de Manoel Carlos.

Quem vem sofrendo do mesmo problema é a atual novela das 21 Horas, Amor à Vida, que já contabiliza duas reclamações formais de classes representativas. A ex-chacretes fizeram bastante barulho nos últimos dias porque se sentiram ofendida. Na novela de Walcyr Carrasco, a personagem Márcia (Elizabeth Savala) é ex-chacrete e disse por mais de uma vez que, após o fim de sua participação no programa do Chacrinha, fez de um tudo para sobreviver, inclusive se prostituiu. A revolta foi geral.

O mais recente caso se dá nas queixas formais que enfermeiros estão fazendo junto ao Conselho Regional de Medicina do Rio Janeiro porque se sentiram ultrajados com a personagem Perséfone (Fabiana Karla), uma enfermeira que paquera praticamente todo funcionário homem do hospital ficcional do folhetim. Segundo as reclamações, esse tipo de cena prejudica a categoria.

As classes têm todo o direito de se manifestar sobre quaisquer espécies de assuntos que possam prejudicá-las, mas é preciso coerência. Teledramaturgia é produto de ficção e não tem como objetivo representar de forma verdadeira e fotográfica nada, muito menos classes trabalhistas (ou ex-trabalhistas, no caso das chacretes). Em ficção, tudo que se precisa é convencer o telespectador de que o que acontece no universo da obra é verdade e não mostrar ao público o que acontece na vida real. Quem mostra vida real é jornalismo, não dramaturgia.

Imagine se os ex-presidentes dos EUA decidem reclamar junto a emissora americana ABC porque se sentiram ofendido quando um personagem, presidente da república, assassinou num hospital uma juiza da Corte americana? (fato acontecido na série Scandal) É preciso saber separar ficção de realidade, pois quando se começa este tipo de reclamação, saímos da zona dos direitos adquiridos e invadimos a zona da censura e da castração da liberdade criativa na produção da arte.

Quanto mais esse tipo de queixa obtiver eco, seja na mídia, seja na justiça ou mesmo na emissora que intervém na obra, mais a arte de se produzir teledramaturgia fica prejudicada, quadrada e fadada a ser sem graça e perde em ousadia. É preciso saber diferenciar ofensas de criação artística para determinados objetivos. Sem isso, não há como se fazer arte.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

As grandes obras resistem ao tempo

Muito se fala em "melhores" para quase tudo. No campo da teledramaturgia não é diferente. Diversas vezes por ano saem listas de melhores em algo. Mesmo este blog lança os melhores do ano, através do Troféu TVxTV. O ser humano tem um fascínio todo especial em criar lista de tudo, inclusive, tentando organizar o que é melhor e o que é pior. A maioria destas listas acaba sendo, de uma forma ou outra, injusta porque é impossível contemplar todas as obras que mereciam figurar e é aí que nasce a controvérsia e a discussão, deixando tudo ainda mais charmoso.

O ponto e partida básico para se determinar uma obra como sendo "uma das melhores" é a sua capacidade de resistir ao tempo. No calor do momento é fácil definir determinado produto como o melhor ou um dos melhores já exibidos, mas essa máxima só será, de fato, verificada após uns 10 anos depois de sua exibição para se notar se houve capacidade de romper a barreira do tempo e se manter como uma obra clássica. Não é tarefa das mais simples.

No Brasil, a principal referência disso é a vilã Odete Roitman (Beatriz Segal). Lá se vão quase 25 anos desde que a personagem surgiu na novela Vale Tudo e ainda hoje ela é considerada a maior vilã de todos os tempos. É bem verdade que vez ou outra surge alguma personagem tentando descoroa-la, mas quase sempre é discussão momentânea e, passado um tempo, ela volta a comandar as listas.

Esta semana vimos um outro exemplo clássico de um produto que resistiu ao tempo, mas percebeu-se isso de uma forma um pouco diferente. O Viva, em comemoração a seus 4 anos no ar, decidiu produzir 04 episódios inéditos do extinto humorístico da Rede Globo, Sai de Baixo. A série até hoje é lembrada com carinho pelos telespectadores e foi responsável por um estilo de humor completamente diferente do que é visto hoje na TV brasileira.

Em qualquer lista ou lembrança de séries brasileiras Sai de Baixo sempre aparece no topo ou nas primeiras colocações - o que, por si só já comprovava que era um produto clássico, pois resistiu ao tempo, 11 anos desde seu final - mas ter a oportunidade de vislumbrar episódios inéditos de um produto com humor tão controverso foi uma oportunidade rara - uma comparação simplista poderia lembrar a volta de Arrested Development nos EUA, também em 2013.

No primeiro episódio, levado ao ar nesta semana, desde o primeiro minuto se percebeu que Sai de Baixo não era uma obra datada e que faria sucesso em qualquer tempo. A acidez do humor e o tom crítico das piadas, além das citações pops dão todo um charme a um formato bem diferenciado e que pode ser considerado ousado ainda hoje.

Se há 15 anos a série fazia piada com a desvalorização do real e o aumento do desemprego, em sua volta conseguiu provocar o mesmo efeito ao criticar o preço do tomate e a situação caótica dos aeroportos, sempre em meio a bordões inesquecíveis. As várias camadas de piada sempre foram o diferencial do produto que brincou com as diversas formas de fazer humor e se mostrou sempre acertada.

Se antes já era possível afirmar que Sai de Baixo era um dos principais humorísticos já produzidos no país, agora, com essa volta, percebe-se que a afirmação é verdadeira. A série resistiu ao tempo, manteve os fãs e, agora, dá a chance da nova geração de telespectadores conhecer um estilo de humor bastante sedutor. Pena que são apenas 04 episódios.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

A teledramaturgia e a História

Olhar para trás sempre foi da natureza humana. Antropólogos estudam o comportamento da História da humanidade ao longo dos milhares de anos desde a evolução da raça - há um certo consenso de que a História começou, no conceito humano a partir do século 13 a.c. - e o fascínio dos homens pela sua própria história é fato consumado. A teledramaturgia não poderia fugir disso e de tempos em tempos surgem folhetins que conseguem apresentar, de forma folhetinesca, uma base histórica importante.

O melhor exemplo desse modelo atualmente é Flor do Caribe. A trama das 18 Horas com assinatura de Walter Negrão e direção geral de Jayme Monjardim vem mostrando um núcleo paralelo que chama a atenção. Seja pelo capricho de roteiro ou pela competência dos atores, fato é que a novela consegue oferecer um ponto de vista dramatúrgico sobre um momento histórico importante para o ser humano.

Ao falar sobre o nazismo e as atrocidades cometidas pelo nazismo de Adolf Hitler contra os judeus durante a Segunda Guerra Mundial, a trama permite que o telespectador, além de acompanhar um roteiro dramaturgicamente bem amarrado, conhecer um pouco mais da História da Humanidade, apresentando ainda os dois pontos de vista do modelo.  Assim, o entretenimento cultural é colocado diante do telespectador que pode ter momentos de lazer e aprender um pouco mais.

Misturar História a dramaturgia é mais comum no Brasil em minisséries. A Rede Globo produziu um sem-número de obras em que a ficção se baseava num momento ou numa figura histórica importante - JK e Mad Maria, para citar apenas duas - mas também houve ficção em momentos importantes da História em que o período era o protagonista da obra, como na deliciosa minissérie de Gilberto Braga, Anos Rebeldes, reprisada pelo Viva há pouco tempo.

Transmitir entretenimento de qualidade olhando para trás e apresentar fatos históricos reais ou colocar personagens em momentos fundamentais da existência humana é importante, porém é preciso que se faça com cuidado. Quando o roteiro não percebe que não tem por função dar aulas de História, antes, de contar apenas uma boa história, o risco de se tornar didático e transformar sua produção numa espécie de telecurso é grande.

O maior exemplo disso foi Lado a Lado. A trama anterior do horário das 18 Horas apresentou para o público diversos momentos importantes da História brasileira, mas sem conseguir transmitir isso de forma lúdica, a impressão que se tinha era de se estar diante de uma aula e não de uma novela. Os equívocos de roteiro prejudicaram que momentos históricos do país fossem vistos de um outro ponto de vista e chamassem a atenção do público que, assim, aprenderia com entretenimento.

Há de louvar quando um autor opta por apresentar fatos históricos ou colocar um período como protagonista permitindo que o telespectador se eduque com entretenimento. Quando os cuidados são tomados e a História não se sobrepõe a história, os louros colhidos são muito válidos e se tem dramaturgia da melhor qualidade.

sábado, 25 de maio de 2013

Teledramaturgia não é lazer, é entretenimento cultural

Desde que a TV produz dramaturgia a discussão existe e, certamente, irá perdurar por muitos anos. É uma questão complexa, afinal, envolve opiniões subjetivas e análises que vão além de prismas pessoais e devem passar por uma leitura da influência social que produtos de ficção tem diante de toda a comunidade de telespectadores.

Enxergar o público televisivo como uma grande massa que não raciocina de forma independente, mas absorve apenas tudo que vê diante da tela não parece ser o melhor caminho para quem tem a responsabilidade social e artística de transmitir algo para outrem. Ainda assim, há os que enxergam na teledramaturgia uma forma exclusiva de desafogo, de lazer, de passatempo. Estes, defendem que a população é tão sofredora que merece um refresco, se divertir e se emocionar sem ser obrigada a ficar raciocinando para compreender a proposta de nossas novelas e séries. É uma visão que deve ser levada em conta.

"Novela é feita para vender xampu", disse certa fez o novelista Aguinaldo Silva. Guardadas as proporções da frase de efeito dita pelo autor, é preciso observar que a novela é um produto que funciona dentro de uma empresa comercial que precisa de retorno financeiro para conseguir funcionar e continuar produzindo novos textos. Isso, contudo, não significa que para "vender xampu", a produção precisa necessariamente passar pelo raso e entrar no campo do puro lazer que não leva a lugar algum, apenas funcionando como um passatempo que mantém o público naquele torpor que não o faz pensar e não provoca nele reações importantes na construção da cidadania.

De fato, a teledramaturgia não tem como função fundamental educar. Mas entreter produzindo crescimento cultural é dever preponderante para quem se propõe a criar histórias ficcionais que serão assistidas pelas grandes massas. Quando uma obra - tanto novela quanto série - consegue ultrapassar a linha do lazer e invade o campo do entretenimento cultural, deve ser comemorado, pois é sinal que está conseguindo produzir algo que irá influenciar verdadeiramente seu público e, num país como o Brasil em que a TV auxilia mais que a escola, conseguir tal feito é de suma importância na construção de uma sociedade mais justa.

Uma novela como Amor à Vida que levanta uma importante discussão como o auto preconceito na homossexualidade e consegue levantar discussões pertinentes sobre o assunto, mostrando o preconceito da família, os medos e conflitos, leva o telespectador a refletir sobre sua postura diante daquelas situações. O resultado é uma geração que reflete sobre seus próprios problemas.

A Vida da Gente foi expert em levar o público a refletir seus conflitos e colocar em xeque suas próprias posturas ao se enxergar nos conflitos das personagens. Discussão semelhante é o que tem sido a toada de Sangue Bom, atual novela das 7. O público se sente representado não apenas através de questões polêmicas e externas, mas quando conflitos internos e traumas são mostrados, é importante para movimentar o raciocínio do público.

O que não contribui para este tipo de produção são os textos rasos e que não tem qualquer proposta fundamental para mexer com o telespectador, ou roteiros que primam pelo diálogo infantilóide ou com exceção de didatismo que prejudica o fluir do texto. Quem pensa em fazer televisão deveria participar da discussão e compreender que teledramaturgia não deve ser pensada como lazer, pois ela não serve para nada, mas quando se consegue levar ao ar um produto de entretenimento cultural, os resultados são muito mais densos e importantes para a sociedade.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Amor à Vida levanta importante debate: o auto preconceito

Discutir a homossexualidade na TV já virou muito mais clichê que propriamente tabu. Foi-se o tempo em que o telespectador, arraigado em crenças completamente arcaicas e conservadoras, se incomodava com a presença de homossexuais nas telenovelas. Difícil imaginar que nos dias atuais possa haver rejeição de personagens assim a ponto deles precisarem ser eliminados da história, como aconteceu em Torre de Babel - exibida nos anos 90, nem tão distante assim, mas em uma eternidade, se considerarmos a mudança de gerações e da sociedade como um todo.

Muitas tramas brasileiras já conseguiram discutir o tema e propôr tratamento de igualdade quando se fala em orientação sexual. Em América, Glória Perez enriqueceu a discussão mostrando os meandros e sofrimento de um homossexual e se viu envolvida numa polêmica ao escrever o primeiro beijo gay da TV, mas que não foi ao ar por censura da emissora. O fato do personagem levantar bandeiras importantes - mesmo tendo sido mostrado de uma forma caricata - acabou em segundo plano e as reflexões acabaram por se focar na tal censura.

Homossexuais não são rejeitados nos folhetins e não é de hoje. No remake de Tititi, Maria Adelaide Amaral conseguiu o que parecia improvável até então. Fez com que o público torcesse pela felicidade de um casal gay e, após a morte de um deles, levou todo o público a se concentrar esperando que o sobrevivente encontrasse seu grande amor. Embora a trama tenha se equivocado em sequências importantes - como na declaração de amor, que termina com um discreto abraço - mostrar que um personagem homossexual pode ser querido pelo público foi importante e acalentou o debate.

Poderíamos citar Amor e Revolução, novela do SBT que levou ao ar o tal primeiro beijo gay da TV - há controvérsias quanto a isso, a série Força-Tarefa também exibiu um beijo lésbico, embora discreto - mas foi apenas para chocar, sem nenhuma proposta mais densa ou qualquer discussão interessante sobre o tema. Muito mais oportunismo do autor que propriamente senso de reflexão.

Já vimos em nossas telenovelas gays de todas as espécies, dos mais caricatos - como em Morde e Assopra - até os mais discretos e quase assexuados - como em Paraíso Tropical. O tema já foi discutido por diversos ângulos, bullying, rejeição familiar, homofobia, praticamente todos os lados da moeda já foram mostrados e é importante que se discuta, pois é um tema recorrente da sociedade.

Antes de Amor à Vida estrear muito se temeu pelo seu vilão Félix. Quando o autor Walcyr Carrasco criou a personagem, grande antagonista do folhetim, como gay, houve quem levantasse questões pertinentes. Um homossexual cometendo atrocidades como roubar e abandonar um bebê no lixo poderia aumentar o preconceito da sociedade? O que se vê, contudo, 04 capítulos após a estreia, é que o personagem caiu no gosto popular de um jeito que impressiona.

Além de ter um texto delicioso, Felix (vivido magistralmente por Mateus Solano) é muito mais complexo em todos os seus preâmbulos. Deixando de lado sua vilania e olhando exclusivamente para sua orientação sexual, a novela propõe uma discussão inovadora, interessante e, mais, de suma importância para a atual sociedade, criando um arquétipo que deveria ser estudado.

Num país em estado de guerra fria entre grupos que apoiam e grupos que repudiam a união civil entre gays, uma novela das 21 Horas levar ao ar um homossexual que não se aceita é muito interessante. Felix não é simplesmente gay, ele é um gay enrustido. Não por pura opção, mas por medo. O texto da sequência exibida nesta quinta-feira, 23, em que a personagem se abre para a esposa, transmitiu uma verdade tão intensa que surpreendeu.

É importante discutir a homofobia, é de suma importância debater direitos de minorias, mas também é válido que uma novela aponte um gay assim, como muitos são, sem a coragem de aceitar sua própria condição e optando por viver da forma como a sociedade lhe ordena. Felix foi uma metáfora brilhante de uma sociedade hipócrita e que precisa rever seus conceitos antes de discutir qualquer outro tema. Quando o vilão se assume para a espoa e implora pelo perdão, dizendo que já sufocou o sentimento antes e poderia sufocar novamente, temos a descrição clara e conceitual da sensação de muitos homossexuais não-assumidos. O sofrimento do vilão, o misto de sentimentos e sensações parecia um estudo antropológico representado de forma artística e digna de aplausos.

Importante debate e que deveria ser visto de forma mais aprofundada pela mídia e também pelos telespectadores. Interessante notar que uma discussão tão densa quanto essa acabou surgindo pelas mãos do autor mais caricato da Rede Globo. Walcyr Carrasco acertou em cheio ao propôr um diálogo sobre homossexualidade, não do ponto do preconceito social, mas do auto preconceito. Se bem conduzida, esta história pode render ótimas cenas. A primeira delas, nesta quinta, foi sensacional.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Sangue Bom é complexa demais para a TV aberta

Com 21 capítulos exibidos até a noite da última quarta-feira, 22, a novela das 19 Horas, Sangue Bom - assinada por Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari, com direção de núcleo de Dênis Carvalho - não está sequer perto de cumprir seu objetivo mais simplório: recuperar a audiência do horário, que foi perdida por sua antecessora. Os números da novela, aliás, acompanham uma queda que preocupa, mesmo ainda estando em sua fase inicial. Porém, é preciso saber analisar tanto os números quanto a trama. O que parece claro é que o folhetim é muito complexo para ser exibida na TV aberta.

Uma análise assim é delicada e cheia de riscos para quem a faz, porém, parece o caminho certeiro ao se refletir tanto sobre a qualidade do produto que vai ao ar diariamente quanto aos números que não refletem aquilo que se vê na TV. Parece evidente que estamos diante de uma preciosidade em que roteiro, direção e elenco fluem livremente e formam um produto de qualidade rara, ainda assim, o telespectador parece não ter comprado a história e se interessado suficientemente para assisti-la todos os dias.

O grande entrave de Sangue Bom para a audiência é seu fio condutor. Segundo Vincent Villari, em ótima entrevista ao blog O Cabide Fala, o fio condutor da novela é "a história de Bento e Amora, dois jovens que se amam desde crianças, se separam e, quando se reencontram e percebem que pertencem a universos muito diferentes um passa a lutar para trazer o outro para o seu mundo". Com todo respeito ao autor que, óbvio conhece mais sua própria história que qualquer outro, o blog discorda. O fio condutor da novela me parece muito mais complexo que isso, remete muito mais ao poema Quadrilha, de Carlos Drummondd de Andrade: "João amava Tereza que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém". E também parece ir além disso.

A complexidade de sentimentos e conflitos do sexteto de protagonistas - Bento (Marcos Pigossi), Amora (Sophie Charlotte), Maurício (Jayme Matarazzo), Giane (Isabelle Drummond), Malu (Fernanda Vasconcellos) e Fabinho (Humberto Carrão) - promove uma gama de análises e reflexões que o telespectador mais desatento não consegue perceber. Amor gosta de Bento ou de Maurício? Bento gosta de Amora ou da lembrança do passado? Bento se relaciona melhor com Malu ou com Giane? Giane é amiga ou gosta de Bento? Maurício ama realmente Amora ou é capricho? Malu e Maurício poderiam se apaixonar? Fabinho é tão mau quanto tenta ser? Giane usa o tom masculino como uma forma escudo? Estas são as questões mais óbvias e que, ainda assim, muitos não enxergam. Há muitas outras, ainda mais complexas, como a discussão entre fama e caráter, vingança e gratidão, o ter e o ser. Enfim, são muitas as perguntas que a trama propõe e o público não consegue lidar com a falta de respostas imediatas com que está acostumado no horário.

Uma novela das 19 horas ao pisar no drama normalmente não arrisca e não foge dos clichês. Os últimos grandes sucessos do horário mostram isso. Cheias de Charme tinha dramas simples de suas três protagonistas. Penha sofria com o marido folgado, Rosário sofria porque o namorado não aceitava sua fama e Cida sofria porque buscava o príncipe encantado. Tudo era muito claro na mente do telespectador. Assim também foi em Morde e Assopra, o grande marco da sofrível novela foi a amargura de Dulce, rejeitada pelo filho que se envergonhava de ser pobre. Tititi, remake assinado também por Maria Adelaide Amaral, o drama também era água com açúcar: Marcela, abandonada pelo namorado, tinha que criar uma criança sozinha e se apaixonava por um outro rapaz.

Sangue Bom pisa fundo na complexidade de seu drama e paga o preço. Ao inovar e propor muito mais que simples entretenimento, tentar levar ao público uma história que exige raciocínio, reflexão e construção de ideias, a novela afugenta o telespectador mediano - aquele que procura respostas e soluções rápidas, que quer entretenimento fácil e não enxerga novela como arte ou cultura. Rejeição semelhante sofreu Lado a Lado, uma novela que tentou acabar com o tom folhetinesco e transmitir cultura-histórica e foi totalmente rejeitada.

Se no drama a novela das 19 Horas afugenta o telespectador o mesmo acontece na comédia. Novamente a dupla de autores e sua equipe de roteiristas optou pelo caminho árduo e mais difícil. Fugindo do humor pastelão que normalmente faz sucesso no horário (vide Caras e Bocas) ou mesmo a comédia popular e infantil como a de Cheias de Charme, a proposta foi de apresentar muito do humor cult com metalinguagem, referências pops e frases de efeito. Piadas como "você quebrou uma garrafa na cabeça do Dênis Carvalho" "Claro, ele me convidou para interpretar uma atriz decadente numa novelinha das 7 de dois autores medíocres" são geniais, mas somente funcionam para uma parte pequena da audiência que sabem que Dênis Carvalho é o diretor de núcleo da novela e que a trama é escrita por Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari. A maioria do público ficou sem entender e, por isso, certamente estranhou. Esse é apenas um exemplo de uma gama gritante de piadas complexas demais para atingir o grande público e que, por isso, tornam-se elitizadas demais. Mesmo mal sofreu Tempos Modernos que foi rejeitada pelo simples fato de que suas piadas eram incompreensíveis. Em Tititi, Maria Adelaide Amaral já brincava com a metalinguagem, mas tinha seu escape no humor pastelão com os ataques de Jaqueline ou as brigas dos protagonistas.

Sangue Bom está longe de ser ruim, ao contrário, é uma novela ousada e de qualidade ímpar. Ao propôr uma reflexão mais ampla sobre seus protagonistas, o roteiro tenta instigar a audiência a pensar. E arte nada mais é que isso, a tentativa de levar a sociedade a pensar. Novela é entretenimento, mas pode ser tratado como arte, principalmente quando as pessoas envolvidas estão dispostas a pagar o preço para transmitir um pouco de qualidade para a população. O preço neste caso é comprometer os números de audiência em razão de um produto melhor acabado, melhor construído, mais denso. Quanto mais produtos assim forem ao ar, menos o público vai rejeitar, pois ele vai se acostumar a também pensar diante da TV. Não dói.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Dona Xepa faz estreia convencional e acertada

Estreou na noite desta terça-feira, 21, a nova novela da Rede Record. Com assinatura de Gustavo Reiz, Dona Xepa entra em cena com um objetivo nada simples: recuperar o público de telenovelas da emissora que se perdeu desde a equivocada aposta em Máscaras e que se manteve perdida com Balacobaco. Difícil prever, mas pelo menos nesta estreia, a trama mostrou ser capaz de, ao menos, apresentar um bom produto para o telespectador.

Após duas propostas um tanto quanto ousadas no que se refere a produção de telenovelas, a emissora não quis inovar e isso ficou claro durante todo o primeiro capítulo. Gustavo Reiz que não carrega um currículo tão vasto assim, mostrou-se com um objetivo claro: aproximar o público de suas personagens e, para isso, optou pelo caminho mais fácil, uma estreia convencional, apresentando de forma lenta cada personagem, suas histórias e seus dramas.

Este primeiro capítulo não apresentou nada de novo e que pode ser considerado ousado para a teledramaturgia nacional, mas o convencional não é necessariamente ruim e foi nisso que o roteiro apostou. E apostou com correção. Quando se opta pelo convencional de forma correta, com conteúdo, texto bem escrito e personagens bem delineados, é possível aproximar público e história e, com isso, construir a cumplicidade necessária para transformar um produto televisivo em sucesso.

O roteiro foi, de longe, o principal acerto desta estreia. O autor não quis arriscar, em compensação pôde pensar em cada detalhe dos diálogos e, assim, produzir uma gama interessante neste texto. Todas as personagens e todos os núcleos apresentados mostraram histórias interessantes e ricas, tudo graças a situações que já deixam claro quem é quem, suas personalidades, até mesmo suas histórias e seus prognósticos de futuro. Um grande acerto para uma estreia.

O elenco também surpreendeu. É evidente que montar um elenco de qualidade numa obra fora da Globo não é tarefa fácil, mas desta vez, ao que parece, a Record acertou a mão. Ângela Leal esteve muito bem, firme e demonstrando dominar todas as camadas de sua protagonista. Luiza Tomé também se destacou de forma positiva, mas a dona desta estreia foi Thaís Fersoza. A atriz conseguiu dar humanidade a uma personagem delicada que pode facilmente cair na caricatura.

Mas nem tudo foram flores nesta estreia. A falta de experiência em teledramaturgia novamente pesou e a direção foi bastante equivocada. Com posicionamento de câmeras ruins e, principalmente, marcação de cenas mal planejadas, a direção atrapalhou o fluir de inúmeras sequências e deu aquele ar de "tatibitati" nos diálogos. Uma pena.

É difícil fazer prognósticos baseando-se num capítulo, mas é fato que Dona Xepa chamou muito mais a atenção que suas antecessoras em uma estreia. É preciso paciência para se saber se a novela vai engrenar, mas existem muitas possibilidades para se construir uma boa história. É esperar para ver.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Amor à Vida estreia confundindo agilidade com pressa e erra

Estreou nesta segunda-feira, 20, a nova novela das 21 Horas. Responsável por recuperar a audiência do horário, perdida pela antecessora, Amor à Vida marca a estreia do experiente novelista Walcyr Carrasco no principal horário da Rede Globo e traz o também experiente Wolf Maya como diretor de núcleo e um elenco de peso. Mas a tirar pelo primeiro capítulo, autor e direção misturaram o que o novo modelo de telenovelas vem apresentando e erraram a mão.

Desde A Favorita percebe-se que o público brasileiro busca por tramas ágeis, com diversos acontecimentos e sem as chamadas cenas de barriga. Mas não é fácil estrear um folhetim apresentando agilidade e, ao mesmo tempo, construindo uma trama tensa e densa para que o público consiga acompanhar e - principalmente - comprar tudo que está assistindo. João Emanuel Carneiro arriscou e acertou em Avenida Brasil produzindo o primeiro capítulo mais extenuante que já se teve notícias. A tirar pelo primeiro capítulo, Amor à Vida também tentou, mas não conseguiu.

É bem verdade que, em 20 minutos de estreia, a novela produziu uma quantidade absurda de acontecimentos na vida da protagonista. Paloma (Paolla Oliveira) estava feliz visitando o Peru, feliz por passar na faculdade de medicina, brigou com a mãe, conheceu um hippie, soube que é adotada, transou com um hippie, fugiu dos pais, engravidou e decidiu voltar. Isso poderia facilmente ser caracterizado com agilidade, mas esteve longe disso: foi pressa. Na ânsia de promover uma estreia rápida, o autor confundiu-se e concluiu que apenas vários acontecimentos seriam suficientes, mas esta é meia verdade.

Com tantos acontecimentos sem justificativa, a impressão que se teve é de que a protagonista é uma moça que sofre de problemas mentais porque nenhum adulto saudável teria tantas mudanças de humor num tempo tão pequeno. Ao invés de vender uma trama ágil, o autor vendeu uma história apressada, sem se preocupar em construir um roteiro denso e forte em que sua premissa pudesse se apoiar. Difícil comprar o amor arrebatador que Paloma teve, como também foi difícil comprar todas as suas crises. A atuação de Paolla Oliveira, cheia de caras e bocas, também não contribuiu para isso.

O texto também esteve longe de transmitir segurança. Com todos os clichês e didatismo infantilóide que consagraram o autor, a novela construiu seu primeiro capítulo apoiado na ideia de que o telespectador precisa de tudo mastigado, que ele não é capaz de raciocinar e concluir nada sozinho. Tudo precisa ser explicado ao pé da letra, não há espaços para discussões, e construções de ideias. Por outro lado, ele aproveitou o momento para se renovar e construir uma trama totalmente diferente de tudo que ele já fez e arriscar é sempre válido e fica a torcida para que acerte.

Mas este primeiro capítulo esteve longe de ser ruim. Embora a premissa não tenha se firmado numa construção sólida, as situações mostraram-se interessantes e preparando terreno para uma história que tem tudo para melhorar. Além disso serviu para mostrar um Mateus Solano em estado de graça, criando um vilão sórdido e muito interessante, além de boas aparições de Antônio Fagundes e Suzana Vieira.

O ponto alto desta estreia, contudo, foi uma área técnica. O dedo de Mauro Mendonça Filho, diretor geral da trama, esteve tão claro que saltava aos olhos. O estilo de edição de cenas do diretor conseguiu dar um ritmo minimamente aceitável para a história. Esse modelo já fez sucesso em O Astro e funcionou bem nesta estreia. Ao perceber que o autor queria pressa, o diretor editou as cenas de forma aleatória, sem se preocupar em continuidade e o resultado foi maravilhoso. Ponto para ele. Se nos idos de Xica da Silva a mídia cogitou que a novela era toda responsabilidade do diretor Walter Avancini, ao menos nesta estreia, o mérito foi todo de Mauro Mendonça Filho, um grande diretor que pode tornar essa obra um sucesso.

Amor à Vida estreou cometendo alguns equívocos que podem prejudicá-la, mas seria precipitado e até mesmo um erro afirmar que não estamos diante de uma boa novela. Apesar de mostrar os problemas que o autor já mostrava em outros trabalhos, é preciso um olhar atento, pois as situações, a direção e o elenco podem minimizar a fragilidade dos diálogos ruins. Esses, parecem que estarão presentes em toda a novela.

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