Chegou ao fim ainda há pouco a novela das 18 Horas da Rede Globo. Lançando uma nova autora no cenário nacional, A Vida da Gente, iniciou-se com o objetivo de segurar a impressionante audiência conquistada por sua antecessora, Cordel Encantado. Desde o início, contudo, apesar das excelentes críticas, ela não demonstrou força para segurar índices satisfatórios e chega ao fim como a segunda menor audiência da História do horário, nos números da Grande São Paulo.
Analisar o todo de A Vida da Gente é dividi-la em quatro fases distintas. Sua primeira metade em que a autora construiu uma das histórias mais emocionantes, delicadas e reais de que se teve notícia. Toda a linha narrativa para a construção das protagonistas Ana (Fernanda Vasconcellos, em seu melhor trabalho) e Manuela (Marjorie Estiano, dando outro show) foi tênue, densa e bem proposta. Neste período, mesmo com o coma da protagonista, a história caminhou com a mesma qualidade e o público aceitou a condução das tramas. Foi o melhor momento da novela na audiência.
A segunda fase se deu justamente após a volta do coma de Ana. Sem conseguir manter a toada, Lícia Manzo colocou sua obra em banho maria e, por mais de três semanas, a novela simplesmente não saiu do lugar. Usando o artifício de narração e orelhas - em que personagens reclamam com outros, para dar a chance do público entender os conflitos internos - a novela se sustentou nesta fase exclusivamente nos diálogos, sempre de qualidade, mas que não conseguiriam prender a atenção por tanto tempo. O público fugiu porque parecia não haver história.
A reta final pode ser caracterizada como a terceira fase. Com duas últimas semanas eletrizantes, cheia de viradas, situações constrangedoras para as personagens, o folhetim se reencontrou e brindou o telespectador fiel com excelentes sequências. Mas, este foi o período mais duro da obra. Sem que nenhuma personagem estivesse feliz ou realizado, a novela tornou-se sombria, uma crônica de vidas deprimidas, infelizes e imperfeitas. Com o peso emocional intenso, o público rejeitou a proposta e não houve mais acúmulo de audiência.
A última fase deu-se exclusivamente neste último capítulo. Como bem descreveu um usuário do twitter, o que se viu não foi um último capítulo, foi um epílogo da história. Exagerando no recurso da narrativa, exibindo um grande resumo de toda a história para justificar o desfecho das protagonistas, o capítulo foi moroso, sonolento e não atraiu. Sem que os acontecimentos fossem vistos por situações, mas sempre através de um narrador - ora o Rodrigo, ora a Ana e até a Iná, a narradora oficial - foi impossível se conectar e a beleza da história se perdeu no distanciamento da narrativa.
Há quem preferisse Ana e Rodrigo. Eu era do time Manu e Rodrigo, mas isso é questão de gosto. Na visão do último capítulo, nem as escolhas das protagonistas por seus parceiros conseguiram emocionar. Aliado a isso, o clichê de dialogar com a música-tema e de transformar a história da novela num livro, foi piegas e bastante desagradável.
Mesmo com um fim que mancha sua trajetória, A Vida da Gente cumpriu seu papel de fazer uma corajosa narrativa do cotidiano da nova família brasileira. Uma narrativa um tanto quanto sombria, é bem verdade, uma visão extremamente pessimista, mas com um perfil emocional tão forte que era impossível não se identificar. E serviu para algo mais importante, lançar um novo nome no cenário da dramaturgia: Lícia Manzo.