terça-feira, 14 de junho de 2011

Baú da TV: Cheiro de Cravo, cor de Canela

Em 1975, a Rede Globo completava dez anos de existência e resolveu, como parte das comemorações, fazer uma novela com ares de superprodução. O horário das 22h era conhecido por apresentar histórias mais fortes, e a alta direção da emissora resolveu apostar em um dos mais famosos livros de Jorge Amado para adaptar como novela: Gabriela, Cravo e Canela.

Numa produção impecável, Gabriela foi roteirizada por um dos grandes nomes da televisão, Walter George Durst, que há 10 anos não escrevia novelas, e direção do aclamado Walter Avancini. O elenco foi uma história à parte e contou com estrelas como Paulo Gracindo, Armando Bógus, Dina Sfat, Eloísa Mafalda e Sônia Braga, em sua primeira protagonização.

Na telinha, a história da retirante Gabriela (Sônia Braga) que, fugindo da seca, chega a Ilhéus e vai trabalhar como cozinheira do turco Nacib (Armando Bógus), dono do bar Vesúvio. Logo os dois se envolvem, batendo de frente com alguns tabus sociais da época.

Gabriela é uma história que fala de mudanças. Se o romance da protagonista e de Nacib aponta a necessidade de mudanças sociais, a parte política não fica atrás. Há anos como chefe político da região, o Coronel Ramiro Bastos (Paulo Gracindo), apoiado pelos outros coronéis do cacau, Melk Tavares (Gilberto Martinho), Amâncio Leal (Castro Gonzaga), Jesuíno Mendonça (Francisco Dantas) e Coriolano Ribeiro (Rafael de Carvalho), faz da cidade uma extensão dos seus domínios, um verdadeiro feudo. A oposição, liderada pelo Capitão (Sérgio de Oliveira), não oferece nenhuma ameaça concreta, mas isso se transforma com a chegada de Mundinho Falcão (José Wilker), jovem exportador de cacau, que chega a Ilhéus trazendo ares de renovação e modernidade. A partir daí, a trama de Gabriela se transforma num verdadeiro jogo de xadrez entre os dois chefes políticos. Para complicar, Mundinho se apaixona por Jerusa (Nívea Maria), a neta de Ramiro.

A força de Gabriela esta na trama política, já que o romance entre os protagonistas, mesmo
sendo bem agradável e divertido, em nada contribui para a trama. Nesse item, o proibido amor entre Mundinho e Jerusa acaba sendo mais interessante, pois costura a briga entre as duas facções políticas. Outra trama importante é a do Coronel Jesuíno Mendonça, que ao descobrir que sua mulher, Sinhazinha (Maria Fernanda), mantinha um romance com o dentista Osmundo (João Paulo Adour), mata os dois a tiros. Enquanto a novela segue, acontece o processo do crime. Se o Coronel conta com sua posição política, com o apoio do Coronel Ramiro e do advogado Maurício Caires (Paulo Gonçalves) para sua defesa, a oposição, liderada novamente por Mundinho e pelo advogado de acusação, o Dr, Ezequiel (Jayme Barcellos), trabalham para a condenação do acusado. Ao final, Jesuíno é condenado, algo impensável até então, pontuando o início das mudanças em Ilhéus.

Assisti Gabriela em sua exibição no Vale a Pena Ver de Novo, no final dos anos 80. Confesso
que achei a novela um pouco arrastada. Revendo agora, vejo o quanto eu estava errado. O subtexto colocado por Walter George Durst no roteiro, é genial e corajoso. Em algumas passagens o texto chega até mesmo a ser explícito. Em plena ditadura, em uma fala do Coronel Ramiro, o texto diz: “Ele tomou gosto pela liberdade, mas precisa saber que quem lhe dá essa liberdade sou eu.”

No elenco, difícil saber quem esteve melhor. Tantos atores incríveis e saudosos. As nuances da interpretação de Paulo Gracindo, a criação de Sônia Braga, fazendo uma Gabriela inocente e sensual ao mesmo tempo, todos os coronéis. Gabriela é uma verdadeira aula de interpretação.
Aliás, de interpretação, de texto, de direção... Gabriela é uma verdadeira aula de como fazer novela.


Por: Walter de Azevedo

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