Muito se fala sobre a impressionante queda de audiência das novelas nos últimos anos. Ao olhar para trás, não muito distante e notar que uma novela das 8 da Rede Globo fechava com média de 50 pontos, como foi o caso de Senhora do Destino e atualmente no mesmo horário, Passione sofre para manter 32 de média, ou seja, 18 pontos a menos, a enxurrada de críticas recai sobre a situação da teledramaturgia brasileira. O mesmo exemplo cabe para os outros horários da emissora e também para as novelas da concorrência, tanto SBT quanto Record não conseguem resultados satisfatórios com seus folhetins.
De fato, boa parte das tramas nos últimos anos passaram por problemas de superficialidade, de temas repetitivos e de histórias sem pé nem cabeça. Porém, este não é o principal problema da audiência nas telenovelas brasileiras. O problema é externo e atende pelo nome de Ministério da Justiça. O Ministério perdeu completamente o senso de democracia que rege o país e decidiu criar uma espécie de Ditadura Judicial sobre a televisão brasileira, criando classificação etária sem pé nem cabeça e reclassificando tramas a seu bel prazer, num claro ato de desrespeito aos direitos de livre expressão que a cultura necessita para se tornar ampla e autêntica.
A bizarrice é tamanha que o Ministério reclassificou uma das tramas mais leves da década, Escrito nas Estrelas, por, segundo os 'nobres' juízes, apresentar cenas "fortes", de "mortes", "brigas", "separações" e "adultério". Provavelmente quem disse isso a estas pessoas, vê a novela duas vezes no mês e conclui tamanha imbecilidade.
A novela das 8 (que já começa as 9 por conta disso) vive sofrendo ameaças de reclassificação, o que obrigaria a emissora a jogá-la para as 10 da noite tornando inviável. É impossível criar situações de vilania, ou mesmo de relacionamento humano aprofundado sem mostrar os problemas, os conflitos do cotidiano, afinal, o que é uma novela senão seus conflitos? Já é tempo do Ministério da Justiça arrumar trabalho e fazer cumprir leis importantes e que são descumpridas no país ao invés de ficar cuidando de um problema que não cabe a ele.
O país é uma democracia e cabe exclusivamente ao telespectador decidir o que é ou o que não é viável para ele assistir. Para isto existe o controle remoto, não precisamos do controle do governo censurando a cultura nacional baseado sabe-se lá em que e tomando decisões estapafúrdias como reclassificar uma novela para sua exibição após o encerramento, como ocorreu com Tempos Modernos.
Mas também, num país que preze pela democracia todo e qualquer direito 'roubado' deve ser brigado com fúria, se necessário for, para ser recuperado. É tempo das emissoras darem 'uma banana' para esta classificação etária e, com responsabilidade, desafiar a Ditadura Judicial, apresentando produtos culturais de qualidade, aprofundados e sem medo da tal 'Justiça'. Nos últimos anos ninguém o fez, basta notar que a Rede Record somente coloca cenas fortes de suas novelas após as 10 e meia da noite. O único autor capaz de peitar o Ministério atende pelo nome de João Emanuel Carneiro que, semanas após, sua novela A Favorita sofrer ameaça de reclassificação, deu de ombros e escreveu a magistral cena em que Flora (Patrícia Pilar) leva Gonçalo (Mauro Mendonça) a morte. Aquilo é fazer arte com qualidade.
Democracia preza pela responsabilidade e equilíbrio e tudo que vem faltando ao poder judiciário no Brasil neste caso é isso. Equilíbrio nas decisões. A impressão que se tem, é que os Juízes querem decidir o que eu e você devemos assistir. E isso, obviamente, faz com que as emissoras produzam novelas fracas e o público se afasta, com isso a audiência cai consideravalmente. Pode isso?